Plástico, naturalmente Understand article

Traduzido por Olga Martins de Brito. Sentamo-nos nele, vestimo-lo e cozinhamo-lo; o plástico é omnipresente. A versatilidade e a abundância deste material tornam a sua produção e a sua eliminação muito difíceis. David Bradley explica como investigadores da Universidade de Manchester,…

Professor Webb
Imagem cedida pela
Universidade de Manchester

O brinquedo de plástico encontrado na caixa de cereais é um dos clichés mais frequentes do pequeno almoço. No entanto, a eliminação de milhões de toneladas de lixo de plástico é um problema crescente e necessita de um debate bem mais sério do que uma simples conversa ao pequeno almoço. Uma investigação levada a cabo por Colin Webb e pelos seus colegas Ruohang Wang e Apostolis Koutinas do Centro Satake para o processamento do grão (Satake Centre for Grain Process Engineering) na Universidade de Manchester poderá não só resolver o problema da eliminação do plástico usado como também abrir novas portas para a produção deste material.

Combinando Engenharia, Biotecnologia e Química dos Cereais e com o suporte do Conselho de Investigação em Engenharia e Ciências Físicas (Engineering and Physical Sciences Research Council, EPSRCw1), os investigadores desenvolveram uma técnica inovadora e altamente eficiente que permite processar grãos de cereais de modo a obter bioplástico biodegradável.

Nesse sentido, os investigadores desenvolveram técnicas de extracção de constituintes do grão (através da técnica de pearling) que poderão ser separados e usados como percursores de um grande número de materiais, incluindo açucares de cadeia curta (envolvidos na fermentação), arabinoxilanos (usados em aplicações médicas), o antioxidante ácido ferulico (um percursor de compostos aromáticos, como por exemplo a vanilina) e até comidas funcionais.

Os investigadores
prentendem descascar as
camadas mais externas dos
grãos e moê-las até obter
farinha através da técnica de
‘pearling’ – este material de
partida contem todos os
nutrientes e enzimas
necessárias que os
microrganismos apropriados
necessitam para produzir
bioplásticos

Imagem cedida pela
Universidade de Manchester

Como evitar aterros sanitários

Os plásticos revolucionaram a vida moderna, fornecendo meias de nylon, chupetas em PVC e até preservativos hipoalérgicos em borracha. Apesar de os plásticos serem produtos petroquímicos, meio bilhão de toneladas deste material são produzidas anualmente a partir de hidrocarbonetos fossilizados. A eliminação de plásticos é um problema sério porque os produtos petroquímicos não se degradam naturalmente. O lixe de plástico pode ser incinerado, produzindo no entanto agentes poluidores.

A reciclagem de plástico comporta uma série de problemas, como a limpeza, separação e o desenvolvimento de novas aplicações para materiais de qualidade inferior. Infelizmente, os aterros são o método mais seguro e mais barato para a eliminação do plástico. No entanto, 40% do plástico produzido è acumulado nas lixeiras que estão a encher rapidamente. “Questões ambientais, o aumento das necessidades energéticas, os interesses políticos e o esgotamento das fontes petróleo criaram a necessidade para o desenvolvimento de tecnologias baseadas em materiais renováveis” diz Colin. Juntamente com os seus colegas, ele espera implementar uma técnica alternativa de produção de plástico a partir de uma fonte renovável (como os cereais), substituindo a fonte limitada de petróleo. “A selecção do material bruto de maneira a obter processos sustentáveis depende de factores infraestruturais, económicos e tecnológicos como por exemplo a disponibilidade, mão-de-obra habilitada, tecnologia e custo de produção, e transporte”, explica Apostolis, “Os cereais são dos poucos materiais brutos que actualmente possuem a maior parte desses prerequesitos.” Os cereais são suficientemente nutritivos para manter uma cultura de microrganismos, como o fungo Aspergillus awamori. Esta característica pode ser usada para desenvolver um método genérico para converter o grão em reserva nutritiva e consequentemente em biofuels, produtos químicos ou bioplasticos (plásticos derivados de plantas, e não de petróleo) através da fermentação microbiana.

Os investigadores da
Universidade de Manchester
acreditam que o uso de
micróbios produtores de
plastico pode levar á
substituição de
hidrocarbonetos fossilizados
por campos de trigo

Imagem cedida por David
Bradley

A ideia resulta em numerosas vantagens, a mais importante das quais è o facto de os cereais serem uma fonte renovável e o uso destes cereais ser neutro no que diz respeito ao carbono. Adicionalmente, os produtos derivados da química dos cereais serão biodegradáveis e apodrecem degradando-se em agua e dióxido de carbono no solo; ao contrario do que acontece com produtos em polietileno e PVC cuja degradação demora 10.000 anos. As vantagens socio-económicas para o desenvolvimento de cereais como fonte de plástico incluem a diminuição do consumo de petróleo e o aumento da cultivação de cereais por parte dos agricultores.

Actualmente, existem três métodos para a produção de bioplásticos. O primeiro envolve a sua produção intracelular através da fermentação de derivados de cereais ou outros grãos. Este método necessita de passos de extracção e purificação. O segundo método baseia-se no ‘crescimento’ do plástico no interior da planta, esta técnica exige a recolha e purificação do plástico. Finalmente, os cereais poderão ser modificados para produzir diversos precursores através da fermentação. Estes percursores poderão ser recolhidos, purificados e processados em bioplásticos. Os microrganismos podem ser modificados geneticamente de maneira a produzir os bioplásticos desejados.

Micróbios inteligentes

Os micróbios que produzem bioplásticos utilizam açucares simples (por exemplo glucose) como fonte de carbono e compostos orgânicos nitrogenados (aminoácidos e péptidos de pequena dimensão) como fonte de nitrogénio. Estes nutrientes estão todos presentes nos grãos de cereais. Os grãos também contêm vitaminas e minerais necessários para o crescimento microbiano. Alguns grãos possuem um potencial químico suficientemente elevado para a produção de fontes químicas funcionais. O trigo, por exemplo, contem aglutinina e lípidos (arabinoxilanos, acido fítico e vitaminas) e açucares de cadeia curta. A técnica de ‘pearling’ do grão envolve a remoção das camadas externas do grão seguida da moagem em farinha. A farinha é a fonte de nutrientes e enzimas que os microrganismos necessitam para produzir bioplásticos. “Esta estratégia de refinagem permite a fermentação microbiana para a produção de bioplástico e outros materiais químicos”, diz Colin.

Actualmente a produção de
polímeros biodegradáveis
como o PHB
(polihidroxibutirato – cuja
estrutura é representada
aqui) é muito cara e não è
recomendada para a maioria
das aplicações. Os
investigadores do EPSCR
esperam encontrar uma
estrada barata para plástico
‘verde’

Imagem cedida por David
Bradley

“O bioplástico produzido por micróbios encontrará muitas aplicações sobretudo como plástico descartável, por exemplo para produzir embalagens de comida que não podem ser recicladas.”
Professor Colin Webb

Não será possível desenvolver métodos de processamento que produzem bioplásticos para todas as aplicações, no entanto os investigadores esperam encontrar soluções para a maior parte das necessidades. A produção de bioplásticos a partir de micróbios encontrará muitas aplicações, como a produção de plásticos degradáveis para o empacotamento de comida. Será também possível unir os bioplásticos com outros materiais de maneira a obter bioplásticos resistentes á biodegradação. Adicionalmente, a reciclagem poderá ser desenvolvida como uma metodologia para a produção de materiais mais douradores’, junta Colin. O processamento do grão para a produção de xarope de trigo e outros alimentos produz uma quantidade enorme de lixo e água de esgoto, é caro e não utiliza o máximo do potencial químico desses produtos naturais, como nutrientes e enzimas. A nova técnica de processamento explora o potencial máximo dos grãos de cereal de maneira a criar biorefinarias que produzam bioplástico e outros materiais. Esta abordagem investe em novas aplicações de mercado.

“O glúten, por exemplo, pode ser usado como bioplástico com muitas aplicações potenciais’, diz Apostolis, ‘enquanto que os arabinoxilanos podem ser usados em aplicações médicas de maneira a que nenhum dos produtos secundários sejam desperdiçados.’ Colin adiciona: ‘as indústrias que actualmente produzem plástico terão de passar gradualmente do processamento petroquímico para o uso de biomassas renováveis. ‘A depleção iminente das fontes de petróleo obrigara a proceder a alteração, tornando os cereais a maior fonte de material para a produção de bioplástico.’ De acordo com Colin, o sucesso deste empenho dependera da colaboração entre parceiros industriais e académicos com conhecimentos sobre as necessidades do mercado, a cultivação de cereais e a análise do ciclo de vida. Colin comenta que este projecto foi abordado de modo a melhorar a economia de produção de bioplásticos através da fermentação microbiana.’ Se estes cientistas forem bem sucedidos, os brinquedos de plástico que encontrara de manhã na caixa de cereais serão tão recicláveis como os cereais em si.


Web References

w1 – O EPSRC financia investigação e trabalho de pós-doutoramento em engenharia e ciências físicas em universidades e outras organizações na Grã-Bretanha.

Author(s)

David Bradley è um escritor científico profissional. www.sciencebase.com

Este artigo foi publicado pela primeira vez no volume 37 da Newsline, uma revista trimestral que divulga a melhor investigação financiada pelo EPSRC: www.epsrc.ac.uk

Review

PA produção de plástico não è um tema geralmente abordado nas aulas de ciências, mas este artigo explora um dos campos mais actuais da ciência, tendo em conta os problemas centrais do desenvolvimento da sociedade humana.

Actualmente, o desenvolvimento sustentável dos recursos naturais e o aquecimento global causado pelo ser humano são os factores limitantes para qualquer modelo do desenvolvimento social. Enquanto alguns grupos defendem a energia nuclear ou o desenvolvimento de energias alternativas, Bradley demonstra que os progressos na gestão de recursos renováveis poderão ter um efeito positivo.

Este artigo descreve eficiência, desenvolvimento sustentável, redução do uso de carbono, recursos naturais e de estrutura da sociedade. Adicionalmente, mostra como a especialização científica (frequentemente criticada) permite a progressão em pequenas áreas do conhecimento e como isto pode ser útil.

Durante as aulas, este artigo tem uma aplicação interdisciplinar. Os professores de ciências do ambiente ou de educação ambiental (do ensino básico ou secundário) poderão usá-lo para ilustrar conceitos de base como o desenvolvimento sustentável, o ciclo do carbono e a influência humana neste processo, as mudanças na estrutura da sociedade ou a importância da agricultura e da conservação do solo.

Algumas possibilidades relacionadas com o artigo são:

  1. Os alunos podem deduzir um factor de desenvolvimento sustentável simples de diferentes recursos (plástico convencional, solo agrícola, adubos nitrogenados, madeira, floresta, óleo, biocombustiveis, etc) e usa-lo para discutir as consequências ambientais.

    S =     NGa x (1 +RCr +RUr) 
                         HUa + Da

    Com: NGa =quantidade de génese natural (massa/tempo)
    RCr =taxa de reciclagem (sem unidade, de 0 a 1)
    RUr =taxa de reutilização (sem unidade, de 0 a 1)
    HUa =quantidade utilizada pelo ser humano (massa/tempo)
    Da =quantidade degradada (massa/tempo)
     

  2. Os alunos podem desenvolver modelos simples para o ciclo do carbono, introduzindo os efeitos dos bioplásticos ou biocombustíveis.
  3. Este artigo trata da influência dos bioplásticos na relação entre a agricultura e a industria. Os professores podem relacionar os conceitos da biodiversidade e da diversidade social com a sua influencia nos ecossistemas e na estabilidade e sobrevivência da sociedade.
  4. Os bioplásticos (e os biocombustíveis) necessitam da agricultura e do solo. Os professores podem explorar a importância da conservação do solo, da erosão e da contaminação.
  5. Os alunos podem avaliar a taxa ou a quantidade de lixo de plástico na sala de aulas e a produção de dióxido de carbono pelo grupo. Os alunos também podem avaliar o efeito da substituição do plástico convencional pelo bioplástico na sua produção de dióxido de carbono.
  6. Os professores podem ajudar os seus alunos a desenhar diagramas de fluxo paralelos para os processos envolvidos na produção e na eliminação de diferentes produtos: garrafas em bioplástico ou petroplástico, mesas de madeira ou de metal, biocombustíveis ou gasóleo.
  7. Os professores também poderão pôr perguntas indirectas para mostrar como os bioplásticos podem influenciar as nossas vidas, como por exemplo: Como podem os bioplásticos ajudar a salvar os glaciares do antárctico? Como podem os bioplásticos ajudar a evitar alterações nos níveis do mar? Como podem os bioplásticos ajudar as aves que vivem nas lixeiras da cidade?

Juan de Dios Centeno Carrillo, Espanha

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