O que sabemos sobre o clima? As evidências das alterações climáticas Understand article

Traduzido por Artur Melo. No primeiro de dois artigos, o investigador do clima Rasmus Benestad do ‘Norwegian Meteorological Institute’ examina os elementos de prova para as alterações climáticas.

Nos últimos anos, as alterações climáticas tornaram-se um assunto de política internacional consideravelmente importante, envolvendo o Protocolo de Kyoto e debates em encontros de alto nível tais como as Conferências dos G8. O recente quarto relatório de avaliação (AR4) do ‘Intergovernmental Panel on Climate Change’ (IPCC) afirma que o aquecimento global registado durante as últimas décadas é, muito provavelmente, provocado pela actividade humana (com mais de 90% de probabilidade).

Organizações científicas internacionais têm solicitado medidas para atenuar o aquecimento global provocado pela emissão de gases de efeito de estufa, tal como o CO2; o IPCC e o antigo vice-presidente dos Estados Unidos, Al Gore, partilharam o Prémio Nobel da Paz 2007 pela divulgação de conhecimento sobre as alterações climáticas provocadas pelo Homem; foi atribuído um Prémio da Academia ao documentário de Gore Uma Verdade Inconveniente, e o Stern Review Report considera as alterações climáticas como um grande desafio para o mundo.

Ao mesmo tempo, a comunicação social tem apresentado notícias que dão a impressão que a ciência subjacente ao aquecimento global antropogénico (de origem humana) é controversa, e os debates variam entre aspectos científicos ligados à alteração climática e questões sobre como lidar com essa alteração. Então, o que sabemos nós realmente acerca do clima? Neste artigo examinamos os elementos de prova e os argumentos relacionados com o clima e a alteração do clima.

A história da investigação do clima

É útil colocar a noção de alteração climática no seu contexto histórico, e notar que ela tem sido um tema de debate no passado. No século XIX, os estudiosos debatiam sobre se os climas regionais eram influenciados pela desflorestação, ou se as manchas solares teriam alguma influência no estado do tempo. Nos finais do século XIX, o observatório auroras de Mount Haldde, no norte da Noruega, foi fundado – baseado parcialmente na crença de que a ‘Aurora Borealis’, ou Luzes do Norte, pode influenciar o estado do tempo.

Alguns estudiosos acreditavam que o clima segue determinados ciclos e, olhando para o passado, era possível observar padrões que podiam ser usados na previsão do futuro. Por volta dessa altura, também existiam estudiosos que estudaram os efeitos do aumento da concentração atmosférica de CO2. Pensavam que as variações na concentração de CO2 podiam ajudar a explicar a pronunciadas variações de temperatura associadas às idades glaciares, já que se considerava que os efeitos das modificações na órbita da Terra em volta do Sol eram demasiado fracos para estarem envolvidos. ‘The Discovery of Global Warming’w1 é um ‘website’ excelente acerca destes aspectos históricos.

Reconstruções de CO2 (cinzento) e
temperatura (azul) a partir da carote
de gelo de Vostok. Mais à direita
encontram-se as concentrações
actuais de CO2

Imagem cortesia de Rasmus Benestad

Como sabemos, para começar, que existiram idades glaciares? A teoria de períodos glaciares e inter-glaciares foi inspirada pelas primeiras descobertas geológicas e outros elementos de prova geológicos. Os geólogos questionaram o que tinha esculpido os vales em cordilheiras, provocado a meteorização das rochas e as moreias de glaciares, e apresentaram a única explicação plausível: o gelo. Havia também elementos paleontológicos, tais como vestígios de vegetação e de animais associados com climas mais quentes, e fósseis que sugeriam que o nível da água do mar no passado era diferente do actual.

Mais recentemente, elementos químicos de prova mais firmes foram estabelecidos a partir de carotes de gelo perfuradas em plataformas de gelo da Antártida e Gronelândia (ver gráfico abaixo). Bolhas de ar aprisionadas no gelo, a profundidades que representam o momento em que a camada de gelo se formou, fornecem pistas sobre as temperaturas e as concentrações de gases vestigiais na atmosfera.

O nosso entendimento das idades glaciares assenta em dois pilares: a teoria de Milankovitch que explica como o ‘timing’ das idades glaciares se relacionava com as alterações na órbita terrestre, e a explicação de Arrhenius sobre como as variações dos níveis de CO2 podiam influenciar a temperatura média global.

O debate continua; mas, em retrospectiva, estariam os estudiosos do passado enganados acerca do clima?

Factos sobre o nosso clima

As alterações naturais dizem-nos que o nosso clima é sensível a modificações nas condições externas, tais como a energia que a Terra recebe a partir do Sol. Também sabemos que a temperatura média da Terra à superfície devia ser menor do que é, se considerarmos apenas o balanço entre a energia recebida do Sol e o calor que se escapa para o espaço.

Uma vista da Terra, a partir do
interior da Estação Espacial
Internacional

Imagem cortesia de NASA

Já existe um efeito de estufa natural que mantém a superfície da Terra ~30ºC mais quente que o sugerido pelo balanço energético. Como sabemos isto? Esta noção baseia-se principalmente nas leis da física (que têm sido bem sucedidas em todas as outras situações), que afirmam que o nosso planeta recebe energia apenas a partir do Sol, na forma de luz, determinada pela constante solar de ~1370 W/m2. Se o planeta não aquecer ou não arrefecer ao longo do tempo, então a entrada de energia solar deve estar em equilíbrio com a quantidade de energia que a Terra perde para o Universo

Esta perda de energia segue uma já bem estabelecida lei física (lei de Stefan-Boltzmann), que foi confirmada por experiências laboratoriais e afirma que a perda de calor (radiação de corpo negro) é dependente da temperatura. É também importante ter em conta a proporção de luz reflectida pelo planeta (pelas nuvens e gelo, por exemplo).

O balanço energético pode ser usado para prever a temperatura à superfície de outros planetas do nosso Sistema Solar, e a verificação através de medições empíricas constitui, por isso, um teste científico. A intensidade da luz solar é facilmente calculada a partir da constante solar e da distância do planeta ao Sol.

Geralmente, a temperatura superficial dos planetas diminui à medida que a distância ao Sol aumenta, como é de esperar a partir do balanço energético radiante. Mas alguns planetas – tal como a Terra – apresentam uma temperatura superficial maior que a prevista apenas pelo modelo do balanço energético radiante. Estes são os planetas com uma atmosfera que contém gases de estufa (GHGs=’greenhouse gases’). Por exemplo, a superfície de Vénus, que tem uma atmosfera com GHGs, é mais quente que a de Mercúrio, que está mais próximo do Sol mas não possui atmosfera com GHGs.

Experiências laboratoriais confirmam as propriedades de gás de estufa do CO2. GHGs como o CO2 têm uma propriedade física importante: são transparentes na luz visível mas opacos na luz infra-vermelha (radiação calorífica).

Uma vista da Terra, a partir dal espaço
Imagem cortesia de NASA

O efeito de estufa também pode ser compreendido na perspectiva da física quântica, em que os fotões são absorvidos pelo aumento da rotação ou vibração de certas moléculas.

Quando as moléculas perdem, em seguida, a energia recebida dos fotões, irradiam cerca de metade da energia de volta para o solo. Quando esta energia é adicionada a luz solar recebida, o efeito acumulado é um aquecimento superficial.

Em resumo, a teoria que está na base do efeito de estufa é sólida e baseada tanto em elementos empíricos como na física teórica. Também foi estabelecido a partir de diferentes linhas de provas, que o clima da Terra sofreu alterações no passado. Estas alterações podem ser explicadas com base em variações em factores que influenciam o balanço energético da Terra.


Web References

Resources

  • ‘Climate Change Education’ é um site da internet para alunos, professores e muitos mais: http://climatechangeeducation.org
  • ‘RealClimate’ é um site de comentários sobre a ciência do clima, publicados por cientistas desta área em actividade, para o público interessado e jornalistas. Pretende fornecer uma resposta rápida a notícias em curso e ao contexto por vezes inexistente no essencial do comentário. O debate em ‘RealClimate’ é limitado a aspectos científicos e não inclui qualquer implicação política ou económica da ciência. Ver www.RealClimate.org

Review

Todos já ouvimos falar sobre alteração climática. O assunto é frequentemente abordado pela comunicação social, mas a informação apresentada é muitas vezes incompleta ou distorcido por visões políticas. Na qualidade de professores de ciências, temos de fornecer aos alunos informação correcta e instrumentos para desenvolverem atitudes críticas baseadas em factos e orientadas para uma cidadania activa.

O artigo em duas partes de Rasmus Benestad é muito útil porque apresenta o assunto de forma clara e objectiva, abordando a sua história, elementos de prova disponíveis, contribuição antropogénica e questões controversas. Além disso, dá ao leitor referências web valiosas para posterior aprofundamento dos seus conhecimentos sobre o assunto.

Recomendo este artigo a professores de ciências que pretendem actualizar os seus conhecimentos e a alunos do ensino secundário interessados nos factos ou elementos científicos que estão no centro deste debate. O material é também particularmente adequado para discussão em sala de aula e para uma abordagem interdisciplinar à educação ambiental em escolas secundárias.

Giulia Realdon, Itália

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