A logística desafiante da exploração lunar Understand article

Tradução de Isabel Queiroz Macedo. O caminho para a Lua está cheio de desafios. A que perguntas precisa a próxima geração de exploradores espaciais de responder?

No primeiro artigo desta série de dois expliquei porque querem os cientistas voltar à Lua, quais as perguntas científicas ainda sem resposta e porque é importante encontrar as respostas (Tranfield, 2014). Aqui descrevo alguns desafios a superar no planeamento de uma missão à Lua bem sucedida e algumas pistas para soluções. Os seus alunos, a próxima geração de exploradores do espaço, podem propor ideias e soluções para estes problemas.

Aonde devemos ir na Lua e porquê? 

Aos pólos? Ao equador? Ao lado mais próximo? Ao mais distante? A resposta depende das questões científicas em estudo. As missões Apollo pousaram todas no lado mais próximo da Lua, perto do equadorw1. Os cientistas acham que devemos explorar novos lugares para aprofundarmos o nosso conhecimento sobre a Lua. Destinos com interesse incluem os pólos, particularmente a bacia de Pólo Sul-Aitken, a maior cratera conhecida na superfíciew2 lunar e também a mais antiga e de maior profundidade, o que faz dela um local de estudo de muito interesse para os geólogos da Lua. 

Além disso, a missão LCROSS da NASA determinou em 2009 que há gelo nos pólos, em regiões que nunca recebem luz solar directa w3. Experiências que visem o estudo de gelo lunar têm de incluir os pólos. Seria também interessante explorar o lado mais distante da Lua, mas isso é tecnicamente mais complicado, porque nunca há uma linha directa de contacto visual entre a face mais distante da Lua e a Terra, o que dificulta o controlo da missão e a comunicação.

False-colour mosaic of the Moon
Fotomosaico, de cores falsas, construído a partir de uma série de imagens obtidas com três filtros espectrais pelo sistema óptico da nave espacial Galileo quando voava sobre as regiões do norte da Lua em 1992. A face visível da Lua está do lado esquerdo da imagem.
Cor-de-rosa brilhante: materiais de terras altas, como os que circundam a bacia de impacto oval Crisium, cheia de lava, na base da imagem. Azul a cor-de-laranja: fluxo de lava vulcânica. À esquerda de Crisium, o Mar da Tranquilidade, azul-escuro, é mais rico em titânio do que os mares, verdes e cor-de-laranja, acima. Solos finos ricos em minerais, associados a impactos relativamente recentes, estão representados em tons de azul-claro. Das crateras mais jovens saem raios azuis. A banda monocromática na orla direita mostra a superfície da Lua em imagem não retocada

Imagem cortesia de NASA / JPL

Devem ir seres humanos? Devem ir robôs?

Ou devem ir ambos? Os seres humanos podem fazer mais ciência do que um robô no mesmo período; podem aprender rapidamente com as circunstâncias e usar os seus conhecimentos para avaliar situações novas. No entanto, uma missão tripulada é muito mais cara e põe em perigo mais vidas do que uma missão robótica. Em geral planeiam-se missões robóticas para realizar estudos científicos preliminares: usam-se câmaras e instrumentos científicos para estudar a zona antes da chegada de seres humanos. Após uma série de missões robóticas bem sucedidas, planeiam-se missões tripuladas para executar tarefas mais complexas, incluindo experiências científicas avançadas, construção de habitats e a exploração.

O trabalho de Jack Schmidt, um astronauta da missão Apollo e o único geólogo que esteve na Lua, ilustra bem os benefícios únicos das missões tripuladas. Jack Schmidt reparou numa rocha cor-de-laranja excepcionalmente colorida na superfície lunar e colheu amostras. Estas amostras não planeadas foram extremamente importantes para a nossa compreensão da história da Lua w4e teriam sido perdidas não fora o treino e experiência de Jack Schmidt.

As experiências devem ser feitas na Lua ou na Terra?

As amostras lunares devem estar num ambiente “isent” de ar e água e longe de fontes de contaminação, como seres humanos, naves espaciais ou a atmosfera terrestre. Por isso, o estudo das amostras na Lua reduz o risco de alterações e contaminações durante o transporte. No entanto, o custo e o desafio tecnológico inerentes ao desenvolvimento e lançamento de instrumentos científicos suficientemente pequenos e que funcionem em gravidade lunar limitam o tipo de análises que se pode levar a cabo na superfície da Lua.     

Assim sendo, amostras que requerem múltiplas análises ou instrumentação complexa devem ser analisadas na Terra. Isto implica que devem ser colhidas e transportadas para a Terra com o devido cuidado, de um modo que minimize alterações e contaminações. Os recipientes para transporte de rochas construídos para as missões Apollo são um bom exemplo de quão desafiante esta tarefa pode ser. Foram concebidos para evitar contacto das amostras com oxigénio e água durante a viagem de regresso à Terra; porém, em alguns casos a natureza abrasiva da poeira lunar degradou os vedantes e as amostras ficaram expostas ao ar e à humidade. Outro assunto que é preciso resolver é a amostragem de núcleos de gelo. Os núcleos de gelo obtidos por perfuração podem ser danificados pelo calor gerado durante o processo de colheita. Além disso, as amostras de núcleos de gelo terão de ser transportadas para a Terra em recipientes especialmente concebidos para os proteger do calor, luz, radiação, oxigénio e contaminantes biológicos.

This sample of lunar olivine basalt was collected from the Moon by the Apollo 15 mission. It was formed around 3.3 billion years ago and is now on display in the National Museum of Natural History in Washington, DC, USA.
Esta amostra de basalto
olivina lunar foi colhida na
Lua na missão Apollo 15.
Formou-se há cerca de 3.3
milhares de milhão de anos e
está exposta no Museu
Nacional de História Natural
(National Museum of Natural
History) em Washington, DC,
EUA

Imagem cortesia de
Wknight94/Wikimedia

 

A case used for the transport of lunar samples between the Moon and Earth during the Apollo programme. Inside the case are several sample collection and containment bags, used on the surface for initial sample collection and sorting. These items are on display at the National Museum of Natural History in Washington, DC, USA.
Caixa usada para o
transporte de amostras
lunares entre a Lua e a Terra
durante o programa Apollo.
No interior estão vários
sacos de amostragem,
usados para a colheita e
selecção inicial de amostras
lunares. Estes objectos estão
expostos no Museu Nacional
de História Natural (National
Museum of Natural History)
em Washington, DC, EUA

Imagem cortesia de Tyrol5/
Wikimedia

 

The Orientale Basin is an impact site approximately the size of the American state of Texas.
A Bacia Orientale é um local
de impacto do tamanho do
Texas

Imagem cortesia de Rick Kline,
Universidade de Cornell 

 

Como podemos armazenar as amostras na Terra sem comprometer a sua qualidade?

Nas instalações da NASA para conservação de material lunar, em Houston,Texas, EUA, estabeleceram-se procedimentos adequados para lidar com amostras de solo em atmosfera de azoto, inerte, que asseguram uma boa protecção da humidade, ar e contaminação biológica. Há laboratórios que se dedicam à investigação e análise das amostras e que registam cuidadosamente todos os resultados obtidos com cada uma. Amostras novas, como núcleos de gelo, requerem o desenvolvimento de métodos que garantam a preservação do seu valor científico. 

Quantas missões à Lua deve haver?

Cada missão deve ser planeada com o objectivo de melhorar o nosso conhecimento e a nossa capacidade de exploração. Porém, cada missão requer um investimento considerável, em tecnologia, tempo e dinheiro. Por exemplo, no auge do projecto trabalharam 400 000 pessoas no programa Apollo, que custou 20 mil milhões de dólares americanos em 1970w5 (equivalentes a cerca de 120 mil milhões em 2013). Já a missão Satélite de Detecção e Observação de Crateras (sigla inglesa LCROSS) custou 583 milhões de dólares em 2009 (equivalentes a 633 milhões em 2013w6. A missão LCROSS /LRO foi muito mais barata do que o programa Apollo, mas o seu valor científico foi muito menor e não envolveu missões tripuladas. No planeamento de grandes programas de exploração deve haver um equilíbrio entre missões robóticas e tripuladas que maximize o retorno científico a custos razoáveis. 

Quem deve pagar? Quem deve ir?

No actual panorama político e económico, são muito poucos os países que têm todos os recursos e competências necessários para lançar as suas próprias missões lunares. A cooperação internacional, em que cada um contribui com as suas competências e recursos, permite que todos os países colaborem numa missão conjunta de exploração espacial de longo prazo, à Lua e além. O acordo sobre quais os países que podem enviar astronautas e equipamentos representa um desafio, e isso pode ser um tema interessante para discutir com os seus alunos

Do ponto de vista científico e de exploração, os benefícios de voltar à Lua são enormes. No entanto, há ainda muitos desafios a superar. Isto foi conseguido na era Apollo e a comunidade científica está hoje muito empenhada em fazê-lo de novo. 


References

Web References

Resources

Author(s)

Erin Tranfield trabalhou no Centro de Investigação Ames (Ames Research Center) da NASA, em Moffett Field, Califórnia, EUA, onde estudou a toxicidade de poeira lunar. Erin trabalha actualmente no Instituto Gulbenkian de Ciência, em Oeiras, Portugal, e colabora com a Agência Espacial Europeia no empenho  para retomar a exploração lunar. 

Review

Este artigo (segundo de dois) resume os desafios a enfrentar em viagens futuras à nossa Lua. O artigo proporciona discussões sobre as missões científicas à Lua, o modo de as concretizar e os benefícios que poderão trazer à humanidade.

The article stimulates questions around how or if scientific missions to the Moon provide sufficient benefit to mankind and around how these missions are carried out.

Os alunos podem discutir os seguintes temas:

  • Onde devemos pousar na Lua? Devem ser missões robóticas ou tripuladas?
  • As experiências devem ser conduzidas na Lua ou na Terra? Como devem ser resolvidos os problemas de transporte?
  • Quantas missões devem ser planeadas e quem deve pagar?

Gerd Vogt, Higher Secondary School for Environment and Economics, Yspertal, Austria

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